IN 1.911 acentua ilegalidades sobre a exclusão do ICMS do PIS e Cofins

A tão festejada vitória dos contribuintes em relação à exclusão do ICMS das bases do PIS e da Cofins reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal em 2017, a partir do julgamento do Recurso Extraordinário n. 574.706[1], ainda segue aguardando reconhecimento da derrota pelas autoridades fiscais brasileiras, sobretudo a Receita Federal do Brasil.

Apesar do voto vencedor proferido pela ministra relatora, Carmen Lucia, naquela sessão de julgamento ter sido expresso no sentido de que o ICMS a ser excluído das bases do PIS e da Cofins é aquele destacado na nota fiscal de venda[2], a Receita Federal insiste em restringir esse direito a parcela do ICMS efetivamente recolhido pelo contribuinte ao Erário.

A recente Instrução Normativa n. 1.911 expedida pela Receita Federal, em 11 de outubro e publicada no Diário Oficial da União em 15 de outubro de 2019, contém 766 artigos e pretendeu consolidar todas as normas esparsas a respeito da apuração do PIS e da COFINS, revogando 53 Instruções Normativas editadas entre 2002 e 2015 – que tratavam da apuração dessas contribuições sociais no regime cumulativo, não cumulativo, no regime concentrado, em relação às instituições financeiras, a importação, Zona Franca de Manaus, regimes especiais, entre outros.

O mérito da atual gestão do órgão em consolidar as normas em um único ato normativo deve ser reconhecido e apreciado. Todavia, no que diz respeito ao tratamento dado por esta Instrução Normativa à exclusão do ICMS das bases do PIS e da Cofins, é reprovável a utilização desse ato normativo para desvirtuar o julgamento do STF e coagir os contribuintes a excluir das bases dessas contribuições somente o saldo de ICMS a recolher[3], insistindo em não reconhecer o julgamento realizado em sede de repercussão geral, que expressamente determinou a exclusão de todo o ICMS destacado em nota fiscal.

Faz vista grossa não apenas ao Supremo Tribunal Federal, mas também a todos os Tribunais Regionais Federais da 1ª a 5º Região, que, em uníssono, vem reconhecendo de maneira unânime o direito dos contribuintes em excluir das bases do PIS e da Cofins o ICMS destacado em nota fiscal[4].

Ou seja, afronta o Poder Judiciário e faz tábua rasa de seus julgados, dá ensejo a novas medidas judiciais para resguardar o direito dos contribuintes já reconhecido em decisões transitadas em julgado. O Poder Judiciário fica atolado com novas demandas (as quais vem sendo, inclusive, suspensas) que não precisariam ter sido levadas a apreciação dos julgadores caso o governo brasileiro simplesmente acatasse a derrota que sofreu naquele julgamento de 2017.

Não bastasse isso, no intuito de consolidar as normas sobre apuração de PIS e Cofins, a Instrução Normativa n. 1.911 acabou por revogar o inciso II, do § 3º do artigo 8º da Instrução Normativa n. 404, de 2004, que garantia aos contribuintes a apuração do crédito da não cumulatividade sobre todo o custo de aquisição de bens e serviços, incluindo o ICMS porventura embutido nas notas de compra.

Assim, a Receita Federal se omitiu quanto ao tratamento que deve ser dado ao ICMS destacado nas notas fiscais de compras emitidas pelos fornecedores de bens e serviços da pessoa jurídica, criando insegurança jurídica em relação a base de cálculo para tomada do crédito da não-cumulatividade, pois que deixa em aberto a forma pela qual a pessoa jurídica adquirente de bens e serviços irá tomar o crédito de PIS e Cofins: (i) se sobre o custo de aquisição integral (incluindo o ICMS destacado na nota do fornecedor) ou (ii) se sobre o custo de aquisição líquido (excluindo todo o ICMS destacado na nota do fornecedor).

Interessante notar que, para fins de aproveitamento do crédito da não-cumulatividade do PIS e da Cofins sobre os custos e despesas de aquisição de bens e serviços, é impossível ao adquirente tomar conhecimento do saldo de ICMS a recolher apurado pelo fornecedor sobre aquela venda, o que apenas reforça o anacronismo jurídico criado pela Receita Federal que, de um lado, se omite quanto ao ICMS que poderá ser mantido ou não sobre o custo de aquisição de bens e serviços para fins de tomada de crédito da não-cumulatividade, e de outro lado admite apenas a exclusão do saldo de ICMS a recolher da base de cálculo do débito de PIS e Cofins.

Não nos resta dúvida, portanto, acerca da ilegalidade e inconstitucionalidade desse trecho da Instrução Normativa n. 1.911, que não poderá ser norte para a apuração de PIS e Cofins dos contribuintes. Isso porque afronta direito garantido em decisões transitadas em julgado. Não bastasse isto, regulamenta algo que não está prescrito em lei ordinária, o que, consequentemente, macula tal Instrução Normativa do vício de ilegalidade absoluta, uma vez que extrapola seu papel regulamentador sobre tema que não está expressamente disciplinado em lei[5].

Assim, por qualquer ângulo que se avalie o tratamento dado pela Instrução Normativa n. 1.911 à exclusão do ICMS das bases do PIS e da Cofins se chegará a conclusão de sua ilegalidade e inconstitucionalidade, seja em razão de contrariar jurisprudência unânime do Poder Judiciário, seja por buscar regulamentar tema que não está disciplinado em lei ordinária (afronta ao princípio da legalidade).

Fonte: https://www.conjur.com.br/2019-out-17/opiniao-ilegalidades-exclusao-icms-pis-cofins

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *